domingo, 4 de julho de 2010

O MEDO DA MORTE

Podemos brincar com a morte e dizer que ela é «deixar de pecar repentinamente», ou que «o medo da morte é o mais injustificado de todos os medos, porque não há qualquer risco de acidente para quem está morto» (Einstein).
Podemos afirmar para nós mesmos, como Epicuro, que a morte não nos deve preocupar. Enquanto existirmos, ela está ausente. E quando nos abranger não nos pode incomodar, porque já não existiremos. Ou concordar com Sócrates, quando ele diz «se a morte não envolve sensações, então ela é como um sono, e é um maravilhoso presente».
Mas, contra toda a lógica dos nossos argumentos, a morte não deixará nunca de nos angustiar. Não podemos verdadeiramente ignorar esse «tigre escondido, emboscado e pronto a matar os incautos», de que falam as escrituras budistas.
A morte revolta-nos, e é causa de «loucura», diz-se na Bíblia, no Eclesiastes: «Eis o pior mal, no meio de tudo o que se realiza debaixo do sol: que haja para todos um mesmo destino. Por isso, o espírito dos homens transborda de malícia, e a loucura habita no seu coração». Ela é o elemento central da crueldade da vida, ela destrói em absoluto o «nosso único e precioso tesouro, o nosso eu» (Morin. Ela é injusta).
Tememos a morte, ainda que não seja exactamente pelas razões que Shakespeare enuncia no seu Hamlet: «Quem suportaria tais fardos, gemendo e suando sob uma vida gasta, se não fosse o medo do que há depois da monte, o medo desse país desconhecido, de cujas regiões nenhum viajante regressou, a perturbar-lhe a vontade e a fazê-lo penar por estes campos, em vez de voar para outros que desconhecemos?»
Podemos evitar pronunciar palavras a seu propósito, como diz Montaigne. Podemos tratá-la como um acidente, «revelando por essa via a nossa clara tendência para despojar a morte de todo o seu elemento necessário», como diz Freud. Ou podemos recorrer à religião, a Deus, minimizando por essa via os seus efeitos sobre nós: Quem crê em Deus não morre (S. João). Mas não podemos verdadeiramente esquecê-la.
Podemos argumentar, como Santo Agostinho, que a morte é um passaporte para uma vida melhor, junto de Deus, e que por isso não devemos chorar a morte dos que nos são queridos. Foi o que ele tentou fazer, ao recusar lágrimas públicas pela morte da mãe e do filho Adeodato. Mas não terá ele derramado lágrimas interiores? Não foi ele próprio a dizer que não «podemos esquecer e ignorar a morte»?
O medo da morte é, de facto, uma questão existencial incontornável. Ele está na base de muitas das nossas interrogações sobre o sentido da vida. Ele associa-se à nossa inteligência, da nossa consciência, da nossa condição existencial. «Ao nos dotar de memória, a natureza revelou-nos uma verdade amarga e de outro modo inimaginável: a verdade sobre a imortalidade e a morte» (Santayana).
A nossa memória superior, a nossa consciência, e a nossa capacidade de inteligentemente vermos a vida, e o significado do passado, do presente e do futuro, são também uma fonte de tragédia humana.
Muitas espécies animais podem ignorar a morte. Podem «não ter consciência de si senão como ser sem fim», como diz Schopenhauer. Algumas, poucas, poderão intui-la e temê-la. Mas somos nós que temos dela uma apreensão profunda, com a consequente dor e medo, irremediavelmente angustiantes. 

A CHAVE DISSO TUDO ESTÁ NUMA PALAVRA: REENCARNAÇÃO

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