terça-feira, 9 de fevereiro de 2010

POEMA DE UMA ALMA

Numa região acaltifada de luminosas neblinas, o anjo da Redenção recebia as almas que regressavam da Terra, mostrando-lhes nos firmamentos constelados os sóis que enchiam de melodia e luminosidade o abismo do Universo. Um dos egressos do mundo terreno aproximou-se-lhe, exclamando em soluços:
_ Anjo Salvador, venho da terra como um náufrago desvalido!... Ouro e honrarias não me deram a paz ambicionada! Estou só com minha consciência dilacerada; que fazer, ó mensageiro da redenção, para alcançar aqueles páramos radiosos de ventura que nos aponta a tua mão resplandecente? ...
_ Filho - replicou-lhe com bondade - a solidão em que te achas foi criada pelo teu egoísmo ... aquelas mansões de alegria, onde entrevês a felicidade intraduzível, são conquistadas com o que se faz em bem dos outros ... Escutai-me! a terra ainda é a região dos resgates penosos; milhões de seres lá sofrem e choram, lutam e desfalecem. Volta a esse mundo e prende-te às suas leis. Come do seu pão e sofre-lhe as iniquidades! Labora na grande oficina da abnegação e do sacrifício.
_ Lá encontrarás ciladas tentadoras, mas estarás em temporário olvido para que se valorize o teu esforço.
_ Não te esqueças de amar aos teus semelhantes com o esquecimento dos teus próprios interesses, e quando alcançares o absoluto desprendimento da matéria, terás o poder de criar as tuas próprias asas ... Conhecerás então as belezas universais e conhecerás as flores sublimes dos páramos siderais quando se sabe plantar as sementes da renúncia no solo ingrato da terra! ...
_ A Alma então animada, resoluta, atirou-se ao círculo das reencarnações benfazejas.
_ Inúmeras vezes fracassou no caminho fácil das tentações. O Demônio da Sexualidade, a Ambição do Ouro, o Egoísmo da Posse, a Inquietação da Fama prenderam-na por muitos séculos de dor e de sofrimento.
_ Ia somente aos palácios da Morte para se banhar no pranto dos arrependimentos, retornando à luta com o firme propósito da vitória; até que um dia escolheu um ambiente de lágrimas dolorosas para seus combates. Sua infância foi uma longa tortura e toda a sua vida um rosário de aflições e de angústias; viu o escárnio em lábios que estremecia, feriu-se nos espinhos da ingratidão e chorou na confiança traída.
_ Tudo, porém, suportou com serenidade espartana e com paciência evangélica. Sorriu aos trabalhos e dificuldades da sua existência, sacrificando-se penosamente! ...
_ Todavia, uma hora chegou em que as privações lhe trouxeram o alvará da liberdade.
_ Adormeceu tranquilamente nos braços misericordiosos da Morte e livre da reencarnação e da miséria despertou no santuário esplendoroso da redenção onde um anjo divino lhe descerrou as portas da Imensidade; então a alma liberta, entre lágrimas de reconhecimento e de júbilo, alou-se ao infinito, em cujos jardins deslumbrantes foi colher a flor da sempiterna ventura.
Marta

(Recebida em Pedro Leopoldo a 6 de dezembro de 1934)

do Livro: PALAVRAS DO INFINITO
Psicografia de Fransisco Cândido Xavier - por Humberto de Campos

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